Por Valéria Belém
Jornalista, escritora e psicanalista em formação
Você é apresentado a alguém e sua cabeça logo fica cheia de pensamentos: “o que será que ela achou de mim?”, “pareço inteligente?”, “estou bonito?”, “ah, ela sorriu, então deve ter gostado do que viu….”.
Imagine quanta energia você gasta, o dia inteiro, saindo de sua própria pele para se colocar lá, na cabeça do outro, sem ter a menor noção do que ele está realmente pensando – aliás, a pessoa pode estar com a mente vazia naquele momento e você ali, cheio de suposições. Além do fato de que entrar no outro e não habitar a si mesmo é extremamente cansativo, pior ainda é não perceber que todo esse movimento é totalmente infrutífero. Ou seja, não leva a lugar algum simplesmente porque nunca vamos saber o que o outro está realmente pensando. Às vezes, nem ele sabe.
Tem mais: atender às expectativas (que você mesmo plantou) das pessoas que nos cercam não é garantia de nada. Aí, por exemplo, a mulher que fez tudo “direitinho” – manteve o corpo em forma, aprendeu receitas saborosas, riu na hora certa, fez amizade com a sogra, acompanhou o namorado a todas as festas e nunca disse palavrão – de repente vê o relacionamento acabar. Pior, é “trocada” por outra que não fez nada disso e, mesmo assim, recebeu um pedido de casamento na maior rapidez.
Ah, tá, vamos pensar em um outro cenário para essa mesma mulher, mudando um pouco o roteiro. Imagine que ela finalmente realizou seu maior desejo e tenha estabelecido um lar no qual, claro, continua a fazer tudo “direitinho”. E os anos passam até que, um belo dia, ela acorda com a sensação de que o “direitinho” não foi traduzido em alegria, em felicidade. E agora?
A questão, querido leitor, é que não adianta mudar o cenário (trocar o parceiro, por exemplo) se você mesmo continua invadindo a pele alheia para se garantir. Simplesmente não vai funcionar. Nem com o outro do seu relacionamento amoroso nem com seus pais, irmãos ou amigos.
No livro Comer, Rezar, Amar, baseado na história real de Elizabeth Gilbert, em certo momento a personagem, já em um novo relacionamento após obter o divórcio, vai a uma festa e ouve um comentário que a abala. “Sabe, você parece uma pessoa completamente diferente agora que está com esse namorado novo. Você antes se parecia com o seu marido, mas agora se parece com o David. Você até se veste igual a ele e fala igual a ele. Sabe como algumas pessoas se parecem com seus cachorros? Acho que talvez você sempre se pareça com os seus homens.”
Até aquele momento Elizabeth não sabia, como muita gente não sabe, que existe UM em cada UM de nós. Fora da pele do outro e fora do tecido da cultura que tenta nos padronizar. Repetitivo? Mas é isso mesmo. Desfolhando e abandonando essas cascas de “supostos quereres” alheios, você pode encontrar essa pessoa – que é você, afinal. Esse sujeito que precisa emergir para SE garantir pelo que tem de melhor, o poder de ser UM alguém.
Então, podemos começar nesta trilha considerando linda a palavra “separado”, pois é ela que nos leva a conseguir viver juntos sem estarmos lá na cabeça e na pele do outro. Que tal?