É. Se tem uma questão que todos concordam é que fazer análise custa caro. Caro não, muuuuito caro.
Todos menos, talvez, aqueles que foram imensamente beneficiados por terem passado pelo processo.
Opiniões à parte, Lacan dizia que uma análise, por princípio, tem que custar muito ao analisante (aquele que faz análise). Tem que ser algo em que ele empenhe o seu desejo e se jogue com intensidade. Em outras palavras: se uma análise não for um “investimento” alto na vida de alguém, ela não produzirá os grandes efeitos que ela pode e se propõe a produzir.
Porém, e aí entramos numa seara delicada, tem analista que cobra caro para fazer a mostração de um produto valioso. “Se cobro caro, logo sou bom”. O alto preço cria uma áurea de superioridade.
Falando do analista da hipermodernidade, não daquela sombra caricata que, atrás do divã em silêncio eterno, acha que faz bem o seu papel, ser analista custa muito caro para o próprio. Empreender uma caminhada de vida com alguém é uma empreitada gigantesca. Tem o imenso peso da responsabilidade de lidar com a construção de vidas. Ao cobrar mais, ele pode se poupar (fisicamente inclusive), para estar mais disponível, mais jogado no processo. É a minha prática, não a de todos, concordemos.
Análise não é uma roupa prêt-a-porter, que é produzida em série, para se cobrar menos por cada peça. É uma construção longa e única que depende de muita competência, sensibilidade, amor e arte.
A parte de um analista no processo, como pode parecer ser, não é nem um pouco passiva. Se assim fosse não haveria mudanças. Falar com as paredes que permanecem mudas nos faria mudar sem nenhuma despesa.
Já tive analisantes muito incomodados por não poderem pagar mais, por acharem que o trabalho que estavam fazendo merecia muito mais.
Já aconteceu de eu reduzir drásticamento o preço das sessões de analisantes muito ricos que ao pagarem muito, achavam que eu faria a parte deles. Que estavam comprando esforço, empenho e envolvimento. Ficaram sem chão quando lhes mostrei que o seu dinheiro não comprava certas coisas.
Fazer análise é descobrir que não é ter, é saber fazer com o que voce tem. Nas palavras de Lacan, é o “savoir faire avec”. É olhar um chuchu velho na geladeira e ver nele um suflê delicioso. Isso é saber fazer, não vai ter ninguém lhe soprando atrás da orelha o que fazer daquele chuchu tão sem valor. É o seu savoir faire que o transformará em souflê.
O dinheiro que você gasta na análise é para ficar rico na vida. Rico de saber-fazer.
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Artigo originalmente publicado em O Popular no dia 27 de outubro de 2011.
Quanto custa “renascer”?
Essa é a ideia que norteia a escolha do quadro de Magritte para ilustrar o texto.
Quantos, ao pisar pela primeira vez num consultório de psicanálise, não se definiriam como “mortos-vivos”? E quantos, ao deixarem-no, não se diriam “renascidos”?
Nesta obra, Magritte “parodia” o quadro do pintor neoclássico Jacques Louis David. A imagem original traz a socialite francesa Juliette, esposa de banqueiro e amante da literatura, no lugar do caixão (confira: http://paintingdb.com/art/xl/2/1169.jpg).
Comparando um e outro, percebe-se, portanto, entre outras características, a ironia e a perspectiva subjetiva do traço surrealista de Magritte.
A associação de mais uma forma de linguagem para ilustrar os temas de psicanálise dão leveza, dão vida aos assuntos mais densos a cada um de nós. Comparar estas obras-de arte, visualizar esse caixão cor-de-rosa, tendo citado morte simbólica, age como um bálsamo. É compartilhar de forma criativa , é mostrar que é comum o que poderia ser dramático no isolamento, no narcisismo.
Amei.
Ótima escolha de ilustração!
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