Problemas com a autoestima

Os Amantes (René Magritte, 1928)

– Relações difíceis.

– Namoros curtos que nunca dão certo.

– Casamentos longos que sobrevivem aos trancos e barrancos ou na indiferença.

A lista vai por aí…

Podemos pensar que relacionar-se com o outro é difícil mesmo. Pode ser, mas não é o nó da questão. Não é o principal, não é o que conta de fato.

Então, qual seria mesmo a fonte da dificuldade?

Sinto dizer, não é o outro.

É a falta de autoestima.

Ao nos relacionarmos, esperamos que o outro nos faça sentir amados, importantes, imprescindíveis, bonitos, inteligentes… e mais um monte de coisas boas.

Mas, essas não são coisas para o outro nos mostrar, nos convencer que temos e somos. Precisamos chegar ao relacionamento trazendo-as conosco, senão ficamos mendigos de pires na mão, pedindo uma esmolinha pelo amor de Deus para a nossa autoestima.

Pare com isso!

Desenvolver um sentimento de apreço por si mesmo é coisa que só a gente pode fazer. Desculpe a comparação, mas é como fazer xixi, ninguém faz por nós.

Isso não é tarefa de ninguém mais. Só nossa.

Credo! Olha só que cena: eu não gosto de mim, não me acho grande coisa, mas vou mostrar minha melhor “fachada” para o outro me querer, já que eu mesmo não me acho grande coisa.

É. Quem sabe o outro me convença a mudar de opinião sobre o meu próprio (des)valor, não é mesmo? Quem sabe o outro consiga fazer com eu goste mais de mim mesmo e quem sabe ele até consiga o milagre de fazer com que eu me respeite mais.

Ilusão. Nem tente, não vai funcionar. Suas cobranças só gerarão brigas e desentendimentos porque o outro jamais vai dar o que você está buscando, porque simplesmente ele não pode entrar na sua cabeça e enchê-la de autoestima.

Chegue preparado para viver e trocar com a outra pessoa. Não chegue de pires na mão pedindo autoestima. Não espere que o outro vá fazer um trabalho que só você mesmo está habilitado a fazer.

Porque simplesmente não funciona!

Na psicanálise chamamos de “ter o falo” o fato de alguém ter potência e valor. Sem essas duas coisas a admiração e o desejo simplesmente não rolam.

Se você pede e espera que alguém lhe dê, já está implícito que não tem. Como já disse, o encantamento do outro por você não tem como acontecer. Não adiante pedir, emburrar, brigar. Se não tem, não é o outro quem vai lhe dar.

Já parou para pensar que, na verdade, só você mesmo pode saber o quanto você vale a pena?

Se não acredita nisso, é bem provável que tudo o que vai conseguir é se tornar um colecionador de frustrações e um destruidor de relações possíveis.


Artigo originalmente publicado no jornal O Popular em 13 de outubro de 2011.

Este post tem 3 comentários

  1. René Magritte (1898-1967) integrou o movimento surrealista, que sofreu forte influência da teoria psicanalítica de Freud e do marxismo. Ao lado de nomes como Dali e Breton, pregou que a arte deveria ir além da lógica e da razão; deveria adentrar o terreno do inconsciente. Daí porque, apesar de seu traço realista, a composição causa estranhamento. Objetos comuns e conhecidos em posições incomuns e irreconhecíveis; sugestões oníricas.

    Na imagem que ilustra o artigo, dois amantes se beijam com os rostos cobertos por panos cinzas. É possível especular que talvez sejam estranhos um para o outro. Mais ainda: que sejam desconhecidos para si mesmos. Reverberando a afirmação de Luciene, como exigir consideração do outro se ignoro quem sou, se desconheço meu próprio valor? Esse desconhecimento impede o contato verdadeiro com o outro e comigo mesmo?

  2. Andreia de Paula

    Esse artigo superou de longe a todos. Ele é magnífico. Total e completamente verdadeiro. Vou fazê-lo de artigo de cabeceira.

    Obrigada, por elucidar mais um pouco minha vida, assim como a de muitas pessoas.

    Andreia de Paula

  3. Giovanna

    Fantástico, Luciene! Era bem o que eu precisava ler hoje! Obrigada por dividir seus conhecimentos conosco!

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