Estamos sempre ligados, preocupados com o que o outro pensa de nós.
Achamos que é muito importante que ele saiba quem nós somos para que a relação seja possível e prossiga.
Achamos que é muito importante que o outro nos reconheça, seja justo conosco em suas avaliações, que nos perceba como somos meeesmo para que o amor vingue.
Eu também pensava assim até o dia em que caiu a ficha: o que, de fato, determina a relação não é o que um pensa do outro, como um vê o outro, mas sim o que cada um pensa de si mesmo.
Já que temos um olhar projetivo – que projeta, que desenha, que faz ter forma e que jogamos de dentro para fora – vamos dizer que o outro está pensando determinada coisa de nós, sem nos darmos conta de que somos nós mesmos que, mais ou menos conscientemente, acalentamos tal pensamento.
É exatamente por termos essa maneira muito particular de ver, o olhar projetivo, que o outro tende a pensar que estamos pensando o que, na verdade, ele pensaria naquela situação. Que estamos sofrendo o que ele sofreria. Que intencionamos o que ele intencionaria naquela circunstância.
Ou seja: o que determina o que o parceiro pensa de nós é o que ele pensa de si.
Eureka! É isso!
É por isso que ele/ela insiste em fazer coisas que detestamos – mas ele ama – com aquela cara de anjo feliz como se estivesse nos dando um presente valioso.
É por isso que ele/ela “não entende” que gostemos de algo, que desejemos aquilo outro, ou que detestemos o que ele adora.
Não é que eles “não entendem”. Eles “não aceitam”. E com razão. Não briguem comigo, mas é com razão, sim, já que não sabem (aceitam) que nós não somos eles e que, portanto, não faz sentido gostarmos do que eles detestam. Sequer existe a possibilidade de não correspondermos, já que somos tomados como sendo eles.
Eureka de novo!
O que o outro pensa de si é o que determina o que ele vai ver em mim.
É que o mundo interno do outro é que determina a sua capacidade ou não de viver e ver certas coisas.
Por exemplo: você está na sua, ali, sereno, e o outro pode dizer/interpretar que você está desatento. Se você dá atenção, o outro acha que você “aprontou alguma” e que está puxando o saco para ajeitar as coisas e/ou para calar a própria culpa.
Se o outro se desvaloriza, ele vai ver tentativas suas de desvalorizá-lo o tempo todo.
Se o outro é inseguro e ciumento, vai ver você fazendo manobras para traí-lo o tempo todo.
Peraí, então o inferno é o outro?
Nada disso. O que o outro pensa de si vai determinar a qualidade do que ele vai ver. Quando alguém gosta e admira a si mesmo, vai projetar isso para fora também, podendo até chegar a dar valor a quem não tem.
O que estou propondo é: o que o outro vê em você não é o mais importante para a relação amorosa, mas sim o que ele pensa de si, mesmo porque é isso que vai dar a tônica, o rumo, de tudo o que ele pensa de você, da relação e do mundo.
Um exemplo que gosto de dar com o maior prazer é o de como algumas pessoas intelectualmente bem dotadas, com maior capacidade de se expressar, chegam à análise teorizando um mundo feio, cheio de injustiças e erros, e que, depois de enxergarem sua singular beleza não padronizada, mudam o discurso, vendo um mundo bem mais belo.
Mais uma vez: a interpretação do fora vem do dentro. Projetamos o que pensamos de nós mesmos, o que sentimos que somos.
Dica útil: ao começar uma relação, tente observar o que o outro sente por si mesmo – sem se deixar enganar pelas máscaras que o excesso denunciam – porque você será o cabide no qual o parceiro dependurará a fantasia de quem ele acha que é.
Libertadooor! Você não é tão determinante assim.
Ou seja: a relação com o outro é, antes de tudo, uma relação consigo mesmo.