Os tempos verbais do nosso corpo

            Onde está o nosso corpo?

Em todos os lugares menos no presente, menos na cena, menos no momento que está sendo vivido.

Geralmente quando estamos vivendo algo, o nosso corpo ali presente está dividido, lançado em outro mundo. A mente não está junto com o corpo quase nunca.

Tomemos o exemplo de uma festa que projetamos. Antes da festa, nos preparativos, corremos pra lá e pra cá. Temos ideias e nos ocupamos em tentar torná-las realidade, inventamos, decoramos, definimos, imaginamos, fazemos escolhas, já estamos numa festa. Fazemos tudo imaginando o que acontecerá – note bem que o verbo está no tempo futuro.

A preparação é, em si, uma grande festa, mas será que estamos mesmo de corpo presente nesse momento, curtindo a preparação?

Não. Usualmente não.

Se você é dos poucos que degusta o preparo, nem preciso lhe dizer parabéns porque você faz parte do pequeno grupo dos que têm o seu corpo no tempo presente. Dos que conseguem amarrar o seu corpo no momento vivido.

Se você é assim, curte o presente nos dois sentidos – o tempo presente, o agora e os presentes que a vida lhe dá, que são os acontecimentos momentâneos,iguais ao Maná do Céu, eles só podem ser comidos na hora. Depois se perdem e só no futuro para ter outros. Aqueles nunca mais. E quem não os aproveita fica na fome.

A grande maioria das pessoas passa, aguenta e sofre nos preparativos para a festa com a cabeça no grande dia. Aguenta firme os desencontros, o trabalho de organizar, a ansiedade e o medo de não ficar bom – leia-se: não agradar. Mantém o seu pensamento e coração no grande dia. Para estas pessoas, esse, sim, é o momento de curtir o prazer de estar ali, na festa.

Chega, então, o grande dia ansiosamente esperado. Agora, sim, chegou a hora de curtir, de usufruir da trabalheira toda da organização, que, é claro, o sujeito não curtiu porque estava com a cabeça no dia em que, finalmente, a diversão estaria franqueada.

Durante a festa, a pessoa fica ainda ligada ao “Será que tudo vai dar certo?” Veja só, de novo posicionada no futuro. Sorrisos para todos os lados, porque cara feia, cara de preocupação para a posteridade, nem pensar. Fotos, filmagens  – se assegura de que tudo esteja sendo registrado.

Ou seja, na festa, o “festeiro” tem mais a cabeça – e o corpo, que não está tão presente assim – no passado (será que algo que preparei não vai funcionar?) ou no futuro – quando estiver contando o quanto a festa foi maravilhosa.

Felicidade, então, só no passado ou projetada no futuro. Felicidade vivida e degustada no presente, isso existe? Felicidade vivida até tem. No passado, quando “eu era feliz e não sabia”, ou no futuro, para onde jogamos nossas promessas de tê-la.

Viver a felicidade no momento que ela aparece, degustá-la, dançar com ela, é coisa para poucos.

Nada contra a degustação da felicidade do passado e a do futuro, que muitas vezes só existe em nossa mente, porque quando aconteceu mesmo nem foi vivida no corpo. Nem participamos direito.

É aquela viagem tensa – antes e durante – e que depois é descrita como tendo sido maravilhosa.

Só nas palavras – o que já é alguma coisa, veja bem –, senão seria tudo perdido. Não ter nem a felicidade de se imaginar feliz também já é demais!

Porém, por que viver só de imaginação, se jogando no passado ou no futuro?

Felicidade é vivida no corpo, no corpo presente na cena, no agora, na pele.

Ponha seu corpo na sua vida presente, não o jogue nem para trás nem para frente.

Afunde-se nas águas tépidas da banheira da vida presente.

Afunde-se até o pescoço nas emoções do tempo presente.

Literalmente, sem medo de ser feliz.

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