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Não sabemos o que temos

 

Vou logo avisando: este é mais um artigo na linha da minha campanha “Pare de jogar luxo no lixo”.

Você se lembra que tem os pés lindos? Que consegue fazer uma torta de galinha como ninguém? Que escreve bem? Que tem um sorriso cativante?

Quantas e quantas pequenas e grandes coisas você possui e tem anos que delas não se lembra – todas no fundo do baú e você carente de autoestima, carente de sentir orgulho de si, carente de uma alma flutuante de felicidade?

Há quanto tempo você não chama você mesmo para dançar? Não sai voando pelas nuvens, sentindo o vento em sua pele?

Você sabe mesmo o que tem? Você sente o que tem? Você curte suas realizações presentes, passadas e futuras?

Ou será que você está, como muita gente, remexendo o passado ruim que magoou ou que foi bom e não volta mais? É, felicidade do passado não volta nunca mais. Tristezas também não, só que disso ninguém se lembra.

Pode ser que você esteja também no futuro, prevendo os ganhos fantasiosos que dão prazer, mas não se tornarão realidade se não vivermos o presente que é de onde ele nasce.

No futuro também ficamos tentando prever as ameaças e achando modos de escapar das desgraças anunciadas ou não. Mexer no futuro é um ótimo passatempo para não viver.

Aliás, ficar no passado e no futuro são ótimas alternativas para não viver a vida. Fica-se fixado em um tempo que já foi ou que ainda não é para não correr os riscos do presente, vivido na carne, onde se sente mesmo a dor e o prazer. Fugimos dele para trás e para frente. Ficar nele é só para quem tem “cojones”, seja homem ou mulher.

Ah! É verdade. Não costumamos saber o que temos e principalmente no momento em que temos. Só temos o que estamos vivendo, curtindo, fazendo… qualquer verbo no gerúndio. Condição inelutável do ser humano ter mesmo só o gerúndio, só poder existir no gerúndio, porque passado e futuro só se tem por força de expressão.

Vou deixar aquele bom-dia que poderia ter dado, aquele abraço, aquele sorriso, para depois. Depois quando? Depois, ora, depois sempre tem.

Tem mesmo? Que tal pensar que não tem depois? Como ficariam nossos dias se pensássemos que o depois não está garantido?

Insisto. Como ficariam nossos dias se neles houvesse a certeza da não garantia do depois?

Juro que estou tentando experimentar.

Não tem prateleira no supermercado para você comprar mais vida quando for vendo que já não lhe resta mais muita.

Já ia esquecendo de lhe perguntar: você se lembra de que tem vida para viver – um dia de cada vez. Talvez menos do que isso: um momento de cada vez. Porque sabemos que de um momento para outro: kapummmm! A vaca vai pro brejo e acaba o que era doce.

Sem ser sorumbática: você se lembra que vai morrer? É… a morte também é nossa e com ela só temos uma maneira de lidar: vida nela, que mais longe ela ficará.

Digo sempre que nós, no fundo, nos adoramos, assim como somos mesmo. Quem não gosta da gente é aquele parasita que nos suga a alegria que é o supereu e que eu batizei de SUBEU. Esse não nos deixa gostarmos de nós mesmos porque no seu controle de qualidade só passa a perfeição. E como a perfeição é só para Deus, ficamos sempre devendo, em falta, envergonhados, como criminosos escondendo sempre alguma coisa: as marcas de nossa imperfeição.

Além do quê, lembremo-nos que o mundo padronizado fez com que cada um de nós nos tornássemos os nossos maiores inimigos, pois passamos a negar a nossa singularidade absoluta, a nossa “unicalidade”, para ser igual ao grupo.

Temos, temos e temos, mas será que sabemos tudo o que temos ou continuamos a procurar no outro, no olhar, nas palavras, na aprovação?

Tenha uma relação mais direta com você.

Tenha algo que está acima de qualquer outro objeto…

Tenha você mesmo.

 

Este post tem 2 comentários

  1. Maria Helena Ferreira

    Luciene, o parasita SUBEU deixou de me sugar há muito tempo.

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