Luciene Godoy
Nessa passagem de ano convido-os não somente a brindar a entrada de um novo ano, mas de um mundo novo.
O mundo não está simplesmente mudando. Estamos numa revolução que inverte o tipo de laço social que nos une em sociedade.
Termos como modernidade e pós-modernidade não definem mais o nosso tempo. Estamos numa nova organização sócio-política-ecônomico-afetiva. Sociólogos como Gilles Lipovetsky a chamam hipermodernidade. Filósofos falam de uma nova forma de laço social que Luc Ferry, por exemplo, chama de “um novo amor”.
Estudiosos do nosso tempo, como o psicanalista brasileiro Jorge Forbes, afirmam que estamos vivendo uma revolução imensa, nunca antes presenciada pela humanidade.
O que muda radicalmente neste novo tempo é que, pela primeira vez na história da humanidade, a organização dos laços sociais, as formas de relacionamento, não se dão pela obediência a uma figura superior (verticalidade), não de cima para baixo, mas pela troca com o semelhante em rede, lado a lado. Tendemos a não crer cegamente em partidos e instituições. Estamos mais próximos uns dos outros, porém, em nossas diferenças. O ser humano como “um” e não como “um grupo” vale mais.
Chegamos à era em que o lado emocional está no foco. Vide as empresas mais bem-sucedidas: são elas as que levam em conta o lado afetivo, as relações, o jeito de ser de cada um.
Estamos na era em que as diferenças são aceitas e valorizadas. Pela primeira vez na história da humanidade estamos vivendo num mundo de relações horizontais, em rede, com intensa troca de informações, ou seja, poder – o poder do saber – correndo de um para outro sem muita intermediação.
Teoricamente falando, anote no seu caderninho para se situar daqui para frente, estamos num segundo humanismo (o primeiro foi o do Iluminismo), aonde o homem é considerado, não mais na sua parte de razão, mas na sua parte de desejo.
E o desejo é o que de mais particular e único alguém pode ter. É respeitar o ser humano naquilo que ele tem de mais seu, de absolutamente singular.
O novo mundo já se faz anunciar. Essa nova forma de se relacionar já está por aí na diversidade de relações vividas sem serem consideradas “erradas”. O fora da norma, que é próprio do ser humano, começa a ser aceito.
Parece que está-se admitindo a grande descoberta que a psicanálise já tinha feito cem anos atrás: que o ser humano é movido pelo desejo.
Sim, o mundo é movido pelo desejo, seja ele consciente ou inconsciente.
Então só me resta dizer, feliz mundo novo! Novo mundo de relações nunca antes vividas.
Feliz mundo novo!
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Artigo originalmente publicado no jornal O Popular em 30 de dezembro de 2011.
Emocionante! Lembrando que já vem sendo entendida a questão do homem hoje sentir-se “desbussolado”, podemos pensar junto a este artigo que cada um terá uma bússola que orienta de forma única, que não aponta o mesmo caminho para todos, mas que ainda sim e talvez mais que antes se fazem possíveis os encontros e as trocas nas relações. A bússola não será mais como antes, para localizar um padrão, uma forma “correta” de se relacionar. Podemos sentir conforto na atualidade justamente por entender que se pode seguir a própria bússola, a do desejo!
Viva a liberdade! Podemos celebrar também a caminhada para um reconhecimento mais coletivo, paradoxalmente (?) ao mesmo tempo que está ocorrendo um reconhecimento próprio, um respeito às nossas vontades verdadeiras e não uma repetição de padrões impostos… Podemos casar ou não, ter filhos ou não, trabalhar loucamente ou não, ter vínculos com outras raças e classes sociais, sem tantas recriminações quanto outrora. Somado a isso, desejo que a maldade, fruto do egoísmo, apego e equívocos, diminua, e aí sim, parecerá um mundo novo e melhor. :p
Numa avalanche de informações nunca dantes acontecida, estamos começando aprender a surfar, a escolher a nossa corrente, não mais a que nos ata, mas mergulhando na correnteza do nosso fluxo. E com certeza a mais navegável é a do desejo. Onde iremos através dele? Agora, ao iniciarmos tal jornada, já sabemos do pouco que se pode prever, mas assumindo o risco de que não há mais fiel governo do que elegermos nosso desejo como guia – tudo que virá será honesto conosco.
Eu partilho dessa idéia, de um mundo novo que compartilha as diferenças, de uma ciranda de mosaicos, e de um mix de delícias.