Torre Eiffel, chuva vindo, voltando, ameaçando.
Vento frio, cortante. Céu azul, nuvens brancas e cor de chumbo.
Cascalho claro sob os pés. Gente do mundo todo, olhando, surpresos, embevecidos. Sorrisos bobos, embasbacados, às vezes francos, brilhantes e, sem dúvida, deslumbrados.
No meio desse mar de olhinhos mirando o monumento, de bocas meio abertas, esquecidas de se fechar porque o cérebro está muito ocupado processando a visão, surge, saindo correndo de um miniônibus, um grupo de… de quê mesmo?
Seres humanos. Também eles, gente do mundo, de alguma terra distante, vinda também como os outros tantos diferentes, prestar sua homenagem à bela e esguia torre. Curvar-se em deslumbramento diante daquela que foi construída para ser desmontada algum tempo depois do uso específico para o qual havia sido feita. Seria o arco de entrada da Exposição Universal de 1889 e um monumento de gratidão da França pela Revolução Francesa. Pois é, ela foi feita para honrar um dos mais importantes movimentos que a humanidade já produziu por liberdade, igualdade e fraternidade entre os homens.
Mas a moça seduziu pela sua beleza, leveza, graciosidade e virou – quem diria – o maior símbolo da cidade que a construiu para ser desconstruída. Não bastando isso, também representa o país que a abriga.
Então, irrompe de um veículo aquele grupo de… de quê mesmo?
Ah! De seres humanos orelhudos, com orelhas de uns 20 centímetros de altura, e um após o outro correm em direção ao centro do jardim com a torre nas costas e formam um grupo de orelhudos.
O fotógrafo “clique, clique”. Sorrisos, agitação e de dentro das orelhas surge a torre na telinha da máquina fotográfica.
Imagem de uma torre que brotou das orelhas. Nascendo de orelhas… orelhas cangurus.
Por um breve momento, os muitos turistas desviam seus olhos da torre, e eu que fazia parte dos bichinhos orelhudos pude correr os olhos e rapidamente vislumbrar os olhos ao redor que se voltaram, olharam e sorriram para e com os cangurus.
Alguém fazendo parte de um dos grupos de turistas orientais corre e, solidário, entrega uma bandeirinha da França ao grupo de bichinhos humanos. Havia a participação tácita a algo que não se sabia o que era, mas que, ouso dizer, como a torre, também encantava. Um bando de orelhudos felizes e risonhos dando à luz a bela torre que saía de dentro de suas orelhas naquela fria e ventosa tarde de sábado parisiense.
De repente, a formação canguru se desfez, alguns entregaram panfletos para os turistas “capturados na cena” de um bando de orelhudos agitando o pedaço.
Uns pegaram os folhetos falando do bebê canguru. Outros, com medo de ser um golpe, pedido de dinheiro, sabe-se lá, no mundo não há nada de graça, recusaram.
Mas, algo aconteceu.
Cangurus estiveram mesmo em Paris, não só na torre mas em outros locais e deixaram uma mensagem, um convite.
Sim, a ONG Bebê Canguru visitou Paris, falou com mamães carregando seus bebês em lojas, aeroportos, nas ruas e divulgou que o ser humano tem a necessidade de ter um desmame do corpo da mãe.
Que nós, como os cangurus, precisamos ainda de um tempinho numa barriga externa – a Bolsa Canguru – para acessarmos com menos sofrimento o mundo fora do útero e termos um processo de desmame do corpo assim como temos do leite materno.
Divulgamos que o “buraco no peito”, a abismal “angústia existencial”, é fabricada pelo vazio que nos cerca assim que perdemos o planeta-mãe onde fomos gerados antes de sermos jogados aqui nesse mundo de fora.
A gente esquece disso, né?
Chega de esquecimento! Vamos dar consequência a esse fato: nascemos ainda necessitando da ajuda do corpo da mãe. Vamos instituir o Desmame do Corpo e não somente o do leite.
Falei aqui na passagem do ano que 2014 seria o Ano do Canguru.
E é.