Valéria Ávilla
Motivou-me este texto, a fala de um psicanalista, que num programa de televisão, descontraidamente dizia com toda sabedoria: “Quando o homem começa a gostar, o tesão é grande. Quando aprofunda o sentimento, ele tende a broxar, ou ter problemas no trabalho. E depois, para voltar a ter tesão pela vida… haja terapia!”.
Muitos pensam que o desejo antecede a coragem, por isto o desejo seria algo irracional, incontrolável e possivelmente perigoso. Ledo engano! É preciso ser forte para ver o que se quer. Apenas o nosso desejo pode nos guiar para momentos felizes. Obviamente, que não é tão simples assim, desejar e pronto – tudo requer trabalho. Querer é construção, e a norma, e a moral vigente, decidamente não são as ferramentas para este construir. Requer ir além. O trabalho pode começar pelo o entendimento, mas o que interessa mesmo é aprender usar o que temos em mão, e dessa sucata fazer algo que funcione que nos satisfaça de uma forma prazerosa, e não na forma de um impulso o qual momentaneamente nos alivia e depois nos cobra a consequência – tipo: “Ah! Me estressei com meu chefe, três cervas serve.”- Saio corajoso no volante e…cara no poste. Enquanto poderia ser: “Meu chefe tá um saco, mas aquela aula de fotografia depois do expediente me refaz.”.
Querer ser feliz a todo custo não é frívolo, nem inconsequente; equívoco é tentar ser feliz através do outro. Colocamos a razão, na maioria das vezes, precedendo o direito do querer, por quê? É como se esta nos protegesse de escolhermos a coisa errada, nos impedindo assim de sofrer. Saiba que nunca desejamos as coisas erradas, o que acontece é que detestamos não ser Deus e encarar que sempre existe a possibilidade de não gozarmos do objeto ansiado. Confirma-se assim, que não há nada de imoral ou perigoso com o desejo. O medo é do que vem depois dele. Desejar implica em se arriscar a ganhar ou não. Mas, não ganhar, não é necessariamente perder. Não ganhar pode nos estimular a continuarmos investindo ou nos fazer investir em outro lugar, em outra pessoa, em outro desejo, talvez. Assim nos vemos tal qual, com o medo da morte. Não temos medo da morte, e sim da vida, pois a morte acontece em vida. Morre quem está vivo, só deseja quem está vivo. O MEDO DO DESEJO É MEDO DE VIVER. Não desejar é estar morto, e nos remete a uma mera ilusão de que não corremos mais riscos: risco de não mais perder nada, pois não há mais nada a ganhar.
Morrer em vida é a mais torturante das mortes. Consternar-se pelo que perdeu é bem mais suave do que padecer pelo que nunca teve coragem de obter. Na verdade, quando se é livre para desejar, o lamento de uma perda pode ser tão momentâneo como ver um lindo pássaro bater asas – traz apenas uma leve nostalgia. Lembro que a capacidade de olhar para o lado e logo encontrar outro objeto substituível é proporcional ao que nos permitimos. Afinal, o desejo e seus fins são maravilhosamente infinitos e diversos. O mundo é um mosaico de experiências.
Armadilha é esquecer que a vida biológica é real e não imaginária, e este é o preço que pagamos por nossa existência – ela termina: “O tempo não apita na curva, não para na esquina, não espera ninguém”. Ao citar esse compositor do qual já não me recordo, aponto que o objeto na verdade não interessa, observem que apenas me recordo da mensagem deixada e não do autor. O que de fato importa é o que usufruímos, porque não nos manter desejantes? Continuo médica, mas hoje doei prateleiras de belos livros de Medicina, para poder acessar melhor meus romances.
Poupar desgastes evitáveis é ser fiel ao nosso desejo. E se sempre há algo a se pagar, viver sob essa lealdade nos é muito menos caro – é um barato!
por Valéria Machado Ávilla Coordenação: Luciene Godoy.
Sempre interessante. Nesse exercicio de pensar, o ser cresce e vai conhecendo-se a si mesmo, enquanto aprende a querer com o sentimento. O objeto do querer precisa ser licito, proveitoso e realizavel.
Um abraço.
Marnio Goulart