Fazer o Ano ser Novo

The Beeches (Asher Brown Durand, 1845) - www.metmuseum.org
The Beeches (Asher Brown Durand, 1845) – www.metmuseum.org

Luciene Godoy //

Quantas vezes seu ano virou nesses 365 últimos dias?

Não dá para ser todo dia, senão a bola murcha. A vida é som e silêncio, é ter e não ter, é virar e é ficar.

Falamos, falamos, mas tem uma energia no ar quando o fim do ano vai chegando. Claro, muita gente investe nisso. É a vontade – ou a fantasia, se quiser – de um grande número de pessoas que faz com que haja esta sensação no ar de que coisas boas vão acontecer.

E acontecem, malgrado os pessimistas de plantão que só veem o lado ruim de tudo. Acontecem celebrações, que, por mais previsíveis que pareçam, deixam algum prazer de estar com colegas, amigos ou familiares, com os quais celebramos mais um ano de vida – juntos. Ah! Os milagres da vida…

É o aniversário da nossa sociedade. O nosso estar juntos, por mais espinhoso e espinhento que seja, continua a existir. Celebramos uma paz universal que não existe, mas que continuamos insistindo e querendo que exista. Celebramos uma fraternidade da qual estamos longe, mas não a jogamos de lado com os braços cansados de carregá-la, enquanto tantos a sabotam.

Celebramos o estar juntos quando, também, vivemos nos empurrando. Tentamos não desistir de tentar estarmos juntos, tentamos não esquecer de sonhar.

Ah! Chegou a palavra mágica do Novo Ano que se anuncia: sonhar. Se sonhar é desejar que aconteça,este é o momento universal que escolhemos para mostrar deslavadamente que sonhamos.

Que sonhamos com um mundo “melhor”, sem tantas desigualdades e violência. Se sonhar é querer que aconteça, é muito bom querermos que aconteçam coisas boas para nós e para todos.

Porque sim, este é o momento que escolhemos – como sociedade – para desejarmos tudo de melhor para todo mundo. É o momento de pensar no grupo, em quem está do nosso lado.

Fogos, champanhe, gritos, abraços e mais abraços que, numa ola universal, vão se propagando pelo planeta afora.

Será que isso tudo é ruim? É fútil e raso? Para que celebrar, e o que é pior, o que celebrar? Vamos virar todos avestruzes e enfiar a cara dentro do chão?

Afinal, o que temos para comemorar esse ano? Tanta coisa ruim.

É, mas se não comemorarmos o que tivemos de bom e não botarmos no mundo o nosso sorriso aberto, o nosso brilho no olhar e o nosso desejo de que haja mais do que vale a pena, talvez o mundo fique mais triste e mais morto.

Sonhar é querer, esse querer pode nos levar a fazer, fazer algo pelos nossos sonhos. Fazer do sonho um projeto arquitetônico de uma obra que se queira mesmo construir e não somente sonhar que ela exista.

Podemos pular do sonhar para o fazer. Esse pulo, sim, seria uma grande virada de ano. Virar o ano sonhando, mas não sonho para sonhar e sim sonho para fazer. Desses sonhos que viram realidade. Talvez você até aprenda a já ir sonhando & fazendo.

Podemos fazer uma virada de ano memorável em nossas vidas.

Vire de lado e perceba quem mais está ali. Vire-se de bruços para sentir o cheiro da terra molhada. Vire-se costas e repare mais o céu, as estrelas, seu belo Planeta Azul.

Vire o ano revirando seus conceitos. Vire o ano virando outra pessoa e quebrando junto com o champanhe suas identidades que não mais lhe servem.

Vira, vira, virou… vire a criança feliz que continua a habitar em você e em todos nós. Vire o amigo que você não tem sido e usufrua mais de você com eles, todos eles, os seres humanos que passam o ano inteiro com você. Vire os 50 tons de prazer que nunca ousou experimentar.

Vire-se do avesso e surpreenda a vida – e todos ao seu redor – com um presente inusitado: você novinho em folha, vestido de Ano Novo.


Artigo originalmente publicado no jornal O Popular em 31 de dezembro de 2015.

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