Recebi recentemente um vídeo que chega a assombrar.
Seria o assassinato a sangue frio de alguém? Um horroroso acidente de trem com dezenas de mortos ou qualquer coisa do gênero?
Nem de perto. Era uma cena de um menino de uns 6 anos de idade que tenta acalmar o irmãozinho que chora desesperado, provavelmente em seu primeiro dia de escola.
É chocante! Um choque delicioso! Puxa vida, é possível que um menininho tenha capacidade para tanto!
No vídeo, ele acalma o irmão em prantos usando vários recursos. Um deles é o da palavra, trazendo figuras de potência. “Lembra que mamãe e papai dizem que você já é um homem?”, diz, tentando infundir autoconfiança no irmãozinho.
Outro recurso que ele usa é o do olhar: ele olha firmemente, pega o rosto do pequeno e o conduz a olhar dentro de seus próprios olhos e continua falando para sossegá-lo.
Usa também do recurso tátil: passa a mão sobre o braço e o rosto do irmão choroso, tentando acalmá-lo pelo carinho. O irmão o empurra. Ele volta e continua acariciando-o com segurança e carinho.
No meio daquela situação de impasse, com o garoto chorando inconsolável, ele não perde o rumo. Continua buscando situar e acalmar o irmãozinho. Faz o irmão se lembrar do pai e da mãe, afirmando que eles chegariam na hora de buscar. “Se lembra, se lembra…” – veja bem que ele não fala na hora “certa”, mas na hora de chegar.
Para nos matar de admiração, ele não para por aí. Toma o rosto do irmão nas mãos e diz: “Respira fundo, respira fundo”. O danadinho sabe usar o recurso da respiração como apaziguador da angústia.
Essa criança dá um passeio de habilidade de ajudar alguém a se acalmar.
Ele foi, com certeza, tratado da mesma forma e aprendeu a fazer o mesmo. Tem recursos no seu arsenal para lidar com o medo, com o estar perdido e ameaçado.
Quem tem pânico é porque não consegue dizer para si mesmo (e acreditar): “Respira fundo, você vai achar a solução, você vai dar conta” .
O lado adulto é o lado que dá conta de cuidar de si e que começa a ser fabricado em nossa infância. O desse menino já está em pleno funcionamento.
Pais que exigem coisas fora da realidade – do tipo: “Vou exigir 100% para ver se consigo pelo menos 70%” – criam superegos enceguecedores. Como uma analisante que, chegando em casa com a nota 98 numa prova que valia 100, ouviu da mãe: “Que pena, só faltaram dois pontos”. Ela passou a vida enxergando o pouco que faltava e não o muito que tinha conseguido.
O supereu é a atitude dos pais internalizada. Ele cria crianças que, quando adultas, se julgam imperfeitas o tempo todo – e somos mesmo, o tempo todo mesmo, só que isso não é errado. É a condição humana. E olha que eu não estou falando de descaso, de preguiça nem de falta de empenho.
Não trate seu filho como um incapaz. Tampouco trate-o como o pinico de suas culpas: “Já que não dou tempo (e trata-se de presença e não de tempo), dou tudo o que ele pede”. Aí cria o infeliz e perdido saco sem fundo que quer tudo e não consegue sentir que tem nada.
Fique com os filhos não pela quantidade, mas pela inteireza de gostar de estar junto. Quando o desejo está só em outro lugar o filho sabe que não é ele.
É possível ser uma grande profissional e uma mãe também. Não estou falando das quatro jornadas da mãe – “mulher maravilha” que “tem que” ser mãe, amante, profissional, dona de casa, linda e malhada. Não é tudo isso. É estar presente em cada momento – com todas as falhas – não é a busca da perfeição.
Ser muitas coisas todos somos. Viva cada qual no seu momento, sem desespero.
O sentimento de se estar sempre aquém, vem quando se está aqui, mas já se preocupando com o lá. Assim não se para e não se vive nunca mesmo.
Isto sim, dá a sensação desagradável de não conseguir nunca alcançar “tudo o que se tem que fazer e ser”.