Estamos inaugurando hoje mais um divã no mundo. Mais um lugar para exercitar o que a psicanálise nos permite: a busca por uma melhor versão de nós mesmos. É um convite para vermos de outras formas as certezas fossilizadas, as respostas de sempre que já não mais nos localizam.
Sempre que há confusão e dificuldade de se compreender e resolver situações de impasse, alguém saca a tão conhecida frase: “Manda para o divã!” É como se o divã fosse um moinho para triturar problemas e sofrimento. Como um biodigestor que transforma o que há de pior – excrementos – no tão mais nobre, utilíssimo e embelezador produto dos jardins e plantações do mundo inteiro – o adubo.
No dicionário o vocábulo “divã” é definido como um sofá sem braços nem encosto, espécie de canapé que se pode utilizar como cama. Cama da qual Freud fez um novo uso, para fazer as pessoas acordarem e não para dormirem. Divã significa também uma sessão de psicanálise ou qualquer coisa que faça alusão a ela. É esse o nosso campo aqui.
Nesse espaço que hoje inauguramos,ofereceremos o olhar da psicanálise para fatos diversos da vida.
Há mais de cem anos o divã de Freud dá seu recado na civilização e não é por acaso que sobrevive. É porque ainda consegue se transformar e continuar a dar respostas ao longo das mudanças históricas pela qual o mundo passou nesse tempo.
Essa psicanálise que se reinventa a cada momento é a que nos mobilizará aqui. Nosso divã é um divã do século 21. O que transitará por aqui serão buscas e achados para nossas vidas hipermodernas.
Situando um pouco a nossa história: o divã freudiano foi inventado num momento chamado de “Era Vitoriana”, no qual o gozar da vida e seus prazeres, principalmente o sexual, era proibido. Cada qual se virava como podia. Uns viviam o lado escuso de sua vida inconfessável. Outros matavam pura e simplesmente os prazeres desse mundo e investiam tudo na vida após a morte. Outros ainda adoeciam do corpo e da alma.
Os dramas de nossos avós, de nossos pais e, em certa medida, os nossos também têm sempre algo a ver com impedimentos, desaprovações e condenações. Isso porque viemos de uma formatação social em que nascíamos e vivíamos para um determinado grupo, para nos conformarmos a ele. Se não satisfizéssemos as expectativas alheias, inevitavelmente nos sentíamos “culpados” – a palavrinha demoníaca que rouba a nossa paz interior.
Para quem ainda não percebeu, o mundo não está mais assim não. Está tomando forma um funcionamento diferente do que chamamos de laço social (o que une as pessoas).
Se uma mulher, hoje, diz às amigas que está aguentando o casamento por causa dos filhos, muito provavelmente vai escutar intervenções do tipo: “Filho cresce, casa e vai pro mundo. E você? Se não pensar em seu bem estar, você vai ser uma infeliz cobrando dos filhos a fatura do seu sacrifício”.
Que mudança!
Vocês se lembram do quanto a expressão “se sacrificar por…” era elogiosa? Hoje tende a ser vista como uma escolha cega e para um outro que “não está nem aí pra você”. Cada um é conclamado a fazer escolhas baseada em seu contexto.
É nesse mundo muito mais de escolhas e construções do que de proibições que colocamos hoje um novo divã.
Os leitores que se interessam pela psicanálise, por Freud e Lacan, ou que queiram apenas compreender um pouco melhor esse mundo tão diferente, terão um espaço para, quem sabe, vê-lo com olhos mais curiosos e inventivos, achar novas respostas para problemas antigos e conseguir viver sua melhor versão nesse momento de possibilidades tão assustadoras.
Cabe dizer também que por essa coluna passarão artigos de diversos autores, sempre com um enfoque na subjetividade e na vida afetiva.
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Artigo originalmente publicado no jornal O Popular em 22 de fevereiro de 2013.
Querida Luciene, sugiro adicionar a imagem, a imagem dá um novo sentido ao texto.